O estranho vazio do primeiro natal

Quando pensamos sobre o nascimento de Jesus, episódio lembrado em cada natal, sempre há algo diferente que nos chama a atenção. É nesse contexto que eu gostaria de perguntar: O que te chama a atenção na história do nascimento de Jesus? Seria o local? A concepção miraculosa? A coragem e fé de José ao aceitar casar com uma mulher grávida?

Para mim, o que mais me chama a atenção é o vazio. Havia um estranho vazio de pessoas e de condições para a vinda de um rei pré-anunciado há tantos anos pelas profecias bíblicas. Veja, por exemplo, que no livro de Miquéias no capítulo 5, verso 2, a cidade de Belém era predita como o local de nascimento do redentor. Além disso, podemos também lembrar que o texto do livro de Números capítulo 24 e verso 17, falava que seu nascimento seria sinalizado por uma estrela especial. Portanto, sendo que havia essas e outras profecias relativas a vinda do salvador é de estranhar o vazio que cercou seu nascimento.

Pode ser que alguém poderia apresentar algumas justificativas: Sendo que essas promessas foram feitas a muito tempo, naturalmente a fé nelas se esfriaria e as pessoas acabariam esquecendo. Entretanto, a fé dos pastores nas colinas de Belém estava bem viva! Outros talvez justificassem o vazio presente no nascimento de Jesus como resultado destas profecias não serem claras o suficiente para que o povo pudesse reconhecer o momento desse acontecimento. Mas, se isso fosse verdade, como explicar que reis orientais puderam reconhecer sinais na natureza e nas profecias a ponto de ir encontrar Jesus em Belém? Em vista disso, a pergunta permanece? Como explicar o vazio do nascimento de Jesus sendo que ele nascera no meio do “povo de Deus”?

Uma sugestão de resposta para esse dilema pode ser encontrada no texto do sábio Salomão presente no livro de Provérbios “Onde não há revelação divina, o povo se desvia” (Pv 29:18). Em outras traduções a expressão “revelação divina” é traduzida como profecias, consequentemente esse termo abrange bem mais que previsões sobre o futuro devendo representar o conhecimento bíblico dos tempos em que se vive. Sendo assim, quando o povo deixa de ter o conhecimento de Deus revelado em sua palavra, acaba por se desviar do plano divino e não mais reconhece os eventos atuais. Em consequência disso, a vida comum havia tragado as pessoas dentro da realidade ordinária de tal forma que a vinda do rei do universo não foi sequer notada. Estamos nós correndo o mesmo risco? Será que nos tornamos cristãos ateus? Alguém que professa acreditar em Jesus, mas se comporta como se ele não houvesse nascido?

O outro vazio que me chama a atenção é o vazio das coisas, ou melhor, de condições materiais para receber um rei, na verdade, O Rei. Uma vez que vivemos em uma época onde corremos atrás de realizar tantos preparativos para formar uma família e receber filhos, é um tremendo contraste que Jesus tenha nascido em uma família que sequer tinha um lar. Além disso: Não havia quarto decorado; não havia ar-condicionado; não havia nem mesmo paredes. Mas tudo o que realmente precisava estava lá: Uma mãe amorosa e temente a Deus, e um pai protetor, trabalhador e submisso a Deus. Será que não estamos correndo o mesmo risco, nos concentrando naquilo que até pode ajudar mais não é essencial e esquecendo do que realmente importa?

Fico a pensar se, mesmo desejando receber Jesus, não estamos dedicando esforços para preparar o exterior quando o que ele deseja é apenas um coração quentinho, como uma manjedoura, mas aquecido pela fé, onde possa nascer de novo? Meu desejo é que o texto de Gálatas seja uma representação de um verdadeiro natal que pode acontecer agora “já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim” (Gl 2:20). Se vive, é porque nasceu em você! Se nasceu, foi natal!