Quem é o Eu Sou? 10 – Um Deus Santo.

Com fortes dores abdominais, você, depois de muito resistir, resolve ir ao médico. Após uma hora e meia na fila, é chamado para o atendimento. Conversando com o médico, descobre algumas informações, que não o deixam confortável; ele possui a mesma formação que você. Leu os mesmos livros, e tem a mesma idade. Sim, ele não é formado em medicina. É claro que essa é uma história fictícia, porém, como você reagiria caso fosse real? É fundamental ou não que o médico seja alguém diferente de você? Ele precisa ou não, apesar de estar acessível, possuir uma característica que o distingua de seus pacientes? Dentre essas, o conhecimento aprofundado do funcionamento do corpo humano, bem como dos mecanismos corretos para correção de eventuais problemas. Essa diferença necessária pode ser aplicada a outros exemplos, além do médico, de tal forma que, em nossa vida, somos acostumados a reconhecer a necessidade de que haja pessoas diferentes de nós, a fim de proporcionar-nos o que precisamos.

Além da natureza formativa e experiencial diferente da minha, que qualificará o médico a atender-nos com algo além do que podemos ter ou ser, é fundamental que nossa postura também seja completamente diferente ao nos relacionar com essas pessoas quando elas estão na posição de nossos médicos. Por exemplo, imagine que ao entrar em um consultório você fale tudo para o médico, menos os sintomas que sente, ou que  você fala o tempo todo sem permitir que o médico possa dizer o que pensa, e caso diga, você trata as palavras dele como comuns e tão importantes como as de qualquer outra pessoa e, por isso, não as leva a sério. Por último, imagine o que aconteceria se, ao receber a receita com as orientações para sua cura, você simplesmente a descartasse na próxima lixeira. Essas posturas são obviamente imaginárias, pois nunca tratamos os médicos, enquanto médicos, como um de nós. Semelhantemente, não podemos tratar Deus como um de nós, e o conceito que expressa essa peculiaridade é o que chamamos de Santidade!

No contexto do cristianismo, a santidade de Deus traduz a singularidade de Deus perante sua criação, portanto, a separação entre Deus e suas criaturas. Deus não é um de nós, apesar de ter traços semelhantes, pois nos fez a sua imagem e semelhança (Gn 1:26). Isso implica que, tanto pode nos oferecer algo que não possuímos, como requer de nós um relacionamento diferenciado com Ele. Esse conceito de santidade, que no original  significa separação ou distinção, traz, em sua natureza, a singularidade necessária para garantir que em Deus há um diferencial. A santidade  implica que ao participarmos de atividades relacionadas a Deus, experimentaremos algo que não há em nós mesmos. Ele possui propriedades que não podemos alcançar sozinhos. Assim como no caso da relação paciente-médico, é a distinção de papéis entre nós e Deus essencial no processo de sermos curados por Deus.

A santidade da  divindade é a certeza de que Deus é diferente de nós e que possui algo que não temos, e somente nEle encontraremos. Essa santidade é expressa em diversos momentos nos textos sagrados. Por exemplo: quando Moisés conversa com Deus enquanto a sarça estava tomada por fogo, porém sem se consumir (Ex 3:1-6). Deus declara que Moisés deveria retirar suas sandálias, ou seja, mudar de atitude, pois o lugar em que estava era Santo! Mas o que o fez santo? A presença de um Deus Santo. Moisés fica tão impressionado que chega a cobrir a face por reverência à presença de Deus. Outro momento significativo, agora sendo Jesus o protagonista, demonstra a santidade de Deus e de tudo o que se relaciona com Ele. Jesus, ao encontrar pessoas comprando e vendendo dentro do Templo, onde deveria haver comunhão, oração, remissão e cura, se revolta, repreende e expulsa os vendedores que ali estavam, restaurando a santidade do local (Mt 21:12-17).

Há hoje uma tendência de tornar cada vez menos distinguíveis as barreiras entre as atividades comuns e as atividades sagradas. Muitos argumentam que essa separação apenas serve para distanciar as pessoas de Deus. Porém, como descrevemos, tal separação não apenas é fortalecida pelo texto bíblico, como é necessária. Ao dissolvermos essas barreiras, dissolvemos também a santidade de Deus e a sua singularidade, fazendo dele, e de tudo o que está relacionado com ele, algo comum, ou seja, mais do mesmo. E por que precisaríamos de mais do mesmo?

Assim como precisamos de um médico que seja semelhante, mas não igual a nós, precisamos de um Deus próximo, mas ainda diferente, que saiba quem somos e como deveríamos ser, e que possa nos proporcionar aquilo que não possuímos. Sem a certeza da Santidade, não poderemos desfrutar plenamente de um relacionamento totalmente confiável e seguro com Deus. É a certeza de que Ele é especial que faz com que eu tenha uma postura especial e obtenha a cura especial que Ele me oferece.

Portanto, quando você se aproximar dEle, saiba que Deus te ama. Mas, reconheça que Ele é Santo e, como tal, precisa que você se relacione diferentemente com Ele. Ao se ajoelhar, demonstrando sua completa submissão e entrega, reconheça que está diante de quem o conhece e sabe o que é melhor para você, mais do que você mesmo. Esteja mais disposto a ouvir o que Deus tem a te dizer.

Publicado por

Rafael Christ Lopes

Cristão, professor de Física com doutorado em cosmologia, leitor de filosofia, teologia, filosofia e história da ciência, e agora iniciando na neurociência. Alguém que entende o cristianismo como a Verdade Absoluta que permite compreender e lidar com todas as questões importantes que nos cercam.

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